quarta-feira, agosto 13, 2008

Mãe: modo de usar

 
 
Mãe: modo de usar
por Bruna Demaison
Você está no bem bom, quentinho, acolchoado, nem repara que as cores do útero lembram um pouco a Casa da Luz Vermelha. De repente é expelida tal qual um cravo, tem muita gente ao seu redor e é entregue a uma mulher totalmente suada e exausta. Opa, já ouviu essa voz antes! Por que ela está com esse olhar enfeitiçado? O que vai ser de você agora?

O primeiro passo é checar em qual categoria você se encaixa:

Primogênito – Também conhecido como cobaia, a diferença entre você e a boneca que sua mãe jogou fora quando casou é que, se for esquecida no armário, você morre.

Filho do meio – a mãe acha que já tem total domínio da função (afinal, seu irmão/irmã mais velho sobreviveu até aqui) e você vai sofrer na pele a teoria de que mais pessoas batem de carro perto de casa por acharem que o perigo já passou.

Caçula – se ela confundir seu nome, releve. É filho demais para os tempos de hoje, sua criação deveria ter sido trabalho da governanta.

Filho único – você está perdido. Será o homem da vida dela ou a mulher que ela sonhou ser e desistiu ao amadurecer.

Passado isso, deve ter percebido que ela já fez planos para você, e não me refiro só ao quarto rosa onde você foi instalada sem opinar. Ela definiu seu nome (e pode ter usado critérios bastante questionáveis), vai cuidar do seu figurino e gerenciar sua alimentação. Vai enfiar você em um collant, calçar sapatilhas e dizer – dança, filha! Vai te obrigar a dividir brinquedos com crianças detestáveis. É assim mesmo, descubra como tirar o melhor proveito - ela se preparou para isso. Você, não!

Em uma primeira fase mães vêm com acessórios que incluem fralda, um paninho onde você pode babar, chupeta para calar a sua boca e mamadeira para quando ela cansar de ser sua refeição. Nessa etapa ela tem a função balanço e vai te sacudir um pouco até deixá-la meio zonza e, portanto, quieta. Aproveite enquanto dura. Com o tempo novos apetrechos vão aparecer: lencinhos de papel para suas lágrimas, cartão de crédito, detector de mentiras e casaco para os dias de sol em que ela jura que vai esfriar. Braços abertos são originais de fábrica, assim como uma quantidade inacreditável de palavras que podem te levar à loucura. Muitos modelos vem com frases prontas: esse cara não presta, aquele outro era um amor, você não está comendo direito, isso não é hora de estar na rua, não sou sócia da Light, você já pensou no que fazer sobre isso, deixa que eu resolvo e a melhor: vai ficar tudo bem.

Uma das atribuições das mães é ensinar, mesmo que às vezes você cobre e não veja o diploma que a qualifica para o papel. São boas também como apoio, guarda-costas, secretária, confidente e médica. A função número um é te amar, o que elas fazem com um pé nas costas (e você pode lembrá-la disso quando estiver em maus lençóis, elas tendem a se sentir culpadas diante de qualquer acusação de mau funcionamento).

Há um considerável risco de mães causarem dependência ou alergia, mas ambos os casos são tratáveis, ainda que não definitivamente, e perfeitamente compreensíveis. Em caso de superdose existem pai, avó, amigos, cônjuges, outros prédios na cidade e avião.  O resto você aprende com os anos: elas são carentes e um pouco psicóticas, você vai ter que dar o braço a torcer, mesmo com tantos planos você vai surpreendê-la. Na verdade vai passar a vida buscando isso e exigindo a cada segundo uma nova prova de amor. Espertamente o comércio vai criar um dia para que você retribua. Seja do contra: não compre nada nesse dia e abrace ela em todos os outros!

 

Nenhum comentário: